sexta-feira, 30 de maio de 2014

Soneto em Segredo







O silêncio me inspira;
me expira votos, segredos disfarçados de fábulas.

Anuncia, desnuda todo vazio, como o tilintar de badalos mudos.
Nem o chiado ao vibrar dos lábios denuncia qualquer resquício, qualquer barulho.

É o silêncio meu predador cínico, maroto, infiel e absoluto.
Inquieto e voraz, absorto no vazio das lufadas por cada fresta de ar.

É soberano, orquestrando a chegada de um vazio oculto, ardiloso,
em rajadas castigadas por gélido olfato, sempre sedento,
vazado na atmosfera engastada, em único e mortal desfecho.






gianovik

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Transitória







"A rigor a vida segue, com sapatos de gala em elegante farrapo, desfilando seus esquálidos ossos pelos oblíquos cantos e vielas.

A vida segue, sempre na sua infame e desonesta farsa social, risos metálicos em dentes forjados na puritana alcova de plácidos solares, olhos esbugalhados numa curiosa "misancene" entre mirar os próprios pés, a não tropeçar no rabo dos transeuntes ao lado, à frente, ou na própria cauda delgada.

A vida segue, ladeira, morro, planície ou serrado, girando sempre ao contrário, como a frear um destino fadado ao descaso.

A vida, puta de qualquer esquina, com um riso famélico de cigarro úmido e opaco, num canto de beiço sofrido e ressecado, mendigando farelos de afeto, qualquer suado e mesclado abraço, cópula miúda e de fétidos odores gástricos, tremores premeditados, tudo na aparência de simples trocados; mentirosos disfarçados de seres afáveis, ungindo seus corpos com bênçãos invisíveis de um deus imaginário.

Essa é a vida humana, paquiderme que se arrasta "abufelado" a espera de um mísero enfarto, algo que traga algum sentido ou ao menos poucos amigos, na aba a levar mais um pobre coitado ao descanso almejado. E afinal, todo esse espetáculo validou ao menos o valor desse cínico parto ? Que ato divino pode se dizer, peregrina num universo de hipóteses e no final, tão óbvio destino ?

Pois ao pó que ventila as narinas, que opera química enérgica e contamina as adegas, meu quarto, ou qualquer desertificado vivente, fará diferença ao fim o raiar do solar compasso ?

O Ciclo de vida é pontual. É final grotesco, onde a obra não justifica nem o fim, quanto mais o alicerce que habita cada começo. Deus hilário, sarcástico, autoritário e sublime, que não encerra nada que começa ou termina de fato a prova nos seus arautos. Como espantalho aos pombos, gralhas e insetos, trepido a tão fremente embaraço, virei casa de insetos, habito agora do outro lado, sem abas, batentes, apoios, tenência, só uma sutil demência. Meu eu. Único e quem sabe, real, ao menos, ao tato. "




gianovik