quinta-feira, 7 de março de 2013

Nostalgia das Horas

Quando criança ganhei meu primeiro relógio. Lembro que sequer sabia decifrar as horas e quando intimado por elas pelo mundo adulto, ficava contando as casas decimais pra saber exatamente que informação ia dar. Adulto é um ser sacana, vê uma criança de quatro anos com relógio analógico no pulso e faz de propósito, só pra embaralhar e embaraçar a cabeça do moleque.

Depois já maior comprei da vizinha, que parcelava em enésimas vezes, meu primeiro relógio digital. Lembro que algumas vezes relutei contra o sono somente pra ver o momento exato em que as horas zeravam e um novo dia surgia no visor.

Hoje, diferente da adolescência em que sempre comprava, trocava ou vendia um destes brinquedos para sempre ter um modelo de relógio melhor, me vejo com vários relógios guardados na gaveta, e todos parados.

Parados porque simplesmente não tem mais bateria. A bateria deles se foi como também se esvaiu o interesse e a magia de todos eles.

São como os brinquedos da infância empoeirados nos armários ou encaixotados nas lembranças no fundo do quarto de despensa.

Não foi a magia dos ponteiros ou o brilho dos dígitos de LCD que abandonou com o tempo seu encanto, e sim a alegria da conquista e o esforço dedicado e infantil que cessou seu movimento em meu espírito.

Os ponteiros parados e os cristais apagados estão representando a hora exata em que inadvertidamente parei, e percebi que o tempo não era contado ou marcado pelo movimento incessante de seus intrincados mecanismos, mas era mensurado sim pela alegria que havia na sensação única de estar de posse de um novo "contador das horas”, um novo instrumento tecnológico, um cronometro regressivo pra novas aventuras, um simples brinquedo que no passar das horas girava junto com o movimento de minha própria existência, regulando a expectativa e ansiedade por novos tempos.

Hoje percebo essa triste realidade meramente lembrando aquele primeiro relógio, e tantos anos depois percebo que minha dificuldade em "ler" as horas não estava presa a questões matemáticas ou a soma de dígitos, mas ao foco naquilo que estava tentando ver. Meu relógio era do Mickey Mouse. Eu prestava mais atenção no desenho do rato e nos seus braços (ponteiros) do que no próprio significado cabal das horas.

A magia da vida e do tempo está nos olhos de quem vê, não no objeto vislumbrado, não no mundo lá fora.

gianovik

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