domingo, 19 de maio de 2013

Folha em Branco







Quando olho pra uma página em branco, me sinto maculando a pureza do silêncio.

De fato gostaria que não fosse necessário escrever, expressar idéias, nortear sentimentos, descrever situações, percrustrar solo sagrado com a infâmia de palavras soltas ao vento. Vejo mais grandeza no vazio de uma folha que na poluição visual das pontuações, sílabas e verbos, impondo sua força de ação e pronomiando as firulas do autor.

Feliz do autor que no silêncio de suas divagações expressa sua sinfonia literária sem macular a essência do branco infinito de uma página.

Claro que esse autor não existe, pois pra haver o nascimento da literatura essa pureza tem que morrer. Na vida parece que tudo tem que desocupar espaço para que algo venha a nascer. Energias contrárias não podem ocupar o mesmo espaço, uma tem que ceder sua existência para o nascimento de outra. Da dor do parto se faz a vida, da mágoa se produz o perdão, do ser humilhado advém o humilde, do erro contra o próximo se cria a consciência do sentimento de correção, do amor desperdiçado se produz a evolução moral. Claro que é uma modo rebuscado dizer que houve “amor desperdiçado”, pois se foi amor verdadeiro e não foi capaz de tocar o coração de quem se amou, é por que essa vida ainda não estava preparada pra entender seu significado.

Somos criados num mundo que se ensina que beleza tem limite, caridade não é pra todos, humildade é para os fracos e o amor, a esse é dos sentimentos mais mal interpretados e levianamente usados. Confunde-se amor com ternura, atração física, sexo, desejo, paixão e muitas outras menores empatias.

Perdeu-se na condição flagelada do homem a essência divina do amor. O homem diz amar por conveniência ou por medo de uma solidão física. Ama-se como troca de algemas, não como sublime desejo de crescimento espiritual e progressão solidária.

O amor não se abala com as vicissitudes do dia a dia, não se encolhe perante os erros, não baixa a cabeça perante os fracassos, não deixa sequer de existir quando é rejeitado, ele cresce sempre e sempre mais, numa expressão geométrica que extrapola o mero egoísmo de quem ama e se regojiza com a felicidade de quem não lhe acolheu.

O amor sequer deveria ter palavra pra designá-lo, deveria ser somente essa energia que promulga o bem indiscriminadamente, presente ou ausente, distante ou próximo, rejeitado ou mesmo mal interpretado, incapaz de fazer o mal ou provocar sentimentos mesquinhos e dores de rejeição.

Só esse amor pode macular folhas em branco sem produzir sons ou denegrir a beleza deste vazio níveo, que pelo amor permanece virgem e inalterado.

Portanto, continuo sentido o silêncio nesta folha.

Nada foi violado.


gianovik

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